Os Judeus foram massacrados por tropas romanas
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Quando os judeus se rebelaram contra a autoridade romana em 70 d.C. – por causa, entre outras coisas, dos altos impostos cobrados –, quatro legiões foram levadas por Tito Vespasiano para sufocar a revolta.
Mapa de Jerusalém em 70, o templo está em amarelo.
Os 70 mil soldados logo viram que a luta não seria fácil. Especialmente quando se defrontaram com as muralhas de Jerusalém, atrás das quais milhares de combatentes judeus buscaram refúgio. A tentativa de invadir a cidade durou sete meses.
Constantemente ameaçados por ações de contra-ataque, os legionários fizeram um dos maiores e mais complexos cercos da Antiguidade. Construíram muralhas, torres de assalto, catapultas, escadas e diversos outros equipamentos que faziam das legiões romanas tropas únicas no mundo antigo – além de ótimos guerreiros, eram também excelentes engenheiros.
O saque de Jerusalém, à partir da parede interior do Arco de Tito, Roma.
Ao fim do trágico combate, quando finalmente conseguiram vencer as três muralhas consecutivas que protegiam a cidade, os legionários, irritados com a resistência dos judeus, promoveram um verdadeiro banho de sangue (foram pelo menos 100 mil mortos) e terminaram por incendiar o Templo de Jerusalém, escravizando os sobreviventes.
Briga demorada
Setenta mil legionários participaram do cerco
Catapulta semelhante a usada na
época, por Eward Poynter (1868).
Puro terrorismo
Para “estimular” os sitiados à rendição, era comum os atacantes promoverem atos de puro terror. Os judeus apanhados pelos romanos fora das muralhas eram crucificados na frente de todos. Um mar de cruzes servia como um aviso macabro do que estava por vir.
Regime forçado
Uma das maneiras de forçar a rendição dos judeus era fazê-los passar fome. E, com a muralha, não havia como fugir. Em Jerusalém, ela foi construída pelas legiões com madeira e terra em tempo recorde: quatro dias.
Tiro ao alvo
A balística – arte de acertar os projéteis no local designado – era cumprida com precisão pela legião romana. Para medir as distâncias dos tiros, os soldados usavam um projétil de chumbo com uma linha amarrada. Já os judeus, a cada bala lançada, avisavam seus camaradas para se proteger. A frase-senha era meio bizarra: “Bebê chegando”.
Só na sabotagem
Os judeus usaram diversos e engenhosos contra-ataques, como túneis subterrâneos, por onde saíam à noite para realizar ataques-relâmpagos contra os romanos. Quando os romanos tomaram a segunda muralha, por exemplo, foram atacados por milhares de guerrilheiros que haviam se emboscado nas casas e escombros do local.
Peça de ataque
A torre de assalto, de madeira e couro, era o alvo predileto dos defensores judeus – e uma peça a ser protegida a qualquer custo pelos romanos. O único jeito de deter o monstro era incendiando-o. E foi o que fez um grupo de judeus liderado por João, o Idumeu, numa ousada ação de sabotagem.
Bate-estaca
O exército romano usou bate-estacas para tentar abrir vãos nas muralhas de Jerusalém. Foi assim que a cidade caiu, ao fim do cerco. Vinte homens e um corneteiro tomaram o local por uma brecha na fortaleza Antônia. Os judeus se imaginaram vítimas de um ataque em larga escala e fugiram.
.:: Aventuras da História
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Quando os judeus se rebelaram contra a autoridade romana em 70 d.C. – por causa, entre outras coisas, dos altos impostos cobrados –, quatro legiões foram levadas por Tito Vespasiano para sufocar a revolta.

Os 70 mil soldados logo viram que a luta não seria fácil. Especialmente quando se defrontaram com as muralhas de Jerusalém, atrás das quais milhares de combatentes judeus buscaram refúgio. A tentativa de invadir a cidade durou sete meses.
Constantemente ameaçados por ações de contra-ataque, os legionários fizeram um dos maiores e mais complexos cercos da Antiguidade. Construíram muralhas, torres de assalto, catapultas, escadas e diversos outros equipamentos que faziam das legiões romanas tropas únicas no mundo antigo – além de ótimos guerreiros, eram também excelentes engenheiros.

Ao fim do trágico combate, quando finalmente conseguiram vencer as três muralhas consecutivas que protegiam a cidade, os legionários, irritados com a resistência dos judeus, promoveram um verdadeiro banho de sangue (foram pelo menos 100 mil mortos) e terminaram por incendiar o Templo de Jerusalém, escravizando os sobreviventes.
Briga demorada
Setenta mil legionários participaram do cerco
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Puro terrorismo
Para “estimular” os sitiados à rendição, era comum os atacantes promoverem atos de puro terror. Os judeus apanhados pelos romanos fora das muralhas eram crucificados na frente de todos. Um mar de cruzes servia como um aviso macabro do que estava por vir.
Regime forçado
Uma das maneiras de forçar a rendição dos judeus era fazê-los passar fome. E, com a muralha, não havia como fugir. Em Jerusalém, ela foi construída pelas legiões com madeira e terra em tempo recorde: quatro dias.
Tiro ao alvo
A balística – arte de acertar os projéteis no local designado – era cumprida com precisão pela legião romana. Para medir as distâncias dos tiros, os soldados usavam um projétil de chumbo com uma linha amarrada. Já os judeus, a cada bala lançada, avisavam seus camaradas para se proteger. A frase-senha era meio bizarra: “Bebê chegando”.
Só na sabotagem
Os judeus usaram diversos e engenhosos contra-ataques, como túneis subterrâneos, por onde saíam à noite para realizar ataques-relâmpagos contra os romanos. Quando os romanos tomaram a segunda muralha, por exemplo, foram atacados por milhares de guerrilheiros que haviam se emboscado nas casas e escombros do local.
Peça de ataque
A torre de assalto, de madeira e couro, era o alvo predileto dos defensores judeus – e uma peça a ser protegida a qualquer custo pelos romanos. O único jeito de deter o monstro era incendiando-o. E foi o que fez um grupo de judeus liderado por João, o Idumeu, numa ousada ação de sabotagem.
Bate-estaca
O exército romano usou bate-estacas para tentar abrir vãos nas muralhas de Jerusalém. Foi assim que a cidade caiu, ao fim do cerco. Vinte homens e um corneteiro tomaram o local por uma brecha na fortaleza Antônia. Os judeus se imaginaram vítimas de um ataque em larga escala e fugiram.
.:: Aventuras da História
Spartacus, o homem que desafiou Roma
O ex-escravo colocou em risco o poder do império durante os três anos de uma rebelião com milhares de comandados que abalou a Itália

Um exército dos mais improváveis virou de pernas para o ar o coração do Império Romano, cerca de 70 anos antes do nascimento de Cristo. Embora fosse inteiramente formada por escravos, a imensa maioria deles sem nenhuma experiência militar, essa força rebelde chegou a contar com 90 mil soldados, deu um trabalho imenso aos principais comandantes de Roma e chegou perto de engendrar o colapso político e econômico da Itália. À frente dos revoltosos estava um ex-gladiador, um gênio militar nato, apesar da origem aparentemente humilde. Seu nome era Spartacus.
Mais de 2 mil anos depois, os detalhes da vida e personalidade desse guerreiro foram quase totalmente engolidos pela lenda. Para os antigos historiadores gregos e romanos, ele não passava de um bandido, enquanto teóricos socialistas e revolucionários de todos os tipos o transformaram num herói quase sobre-humano. Calúnias ou idealizações à parte, o fato é que a história de Spartacus e seu exército mostram à perfeição como a enxurrada de escravos que havia inundado o Império Romano criou um desequilíbrio social de proporções bíblicas. Sem saber, os romanos tinham plantado a semente de seu próprio pesadelo, embora, no fim das contas, tenham conseguido acabar com ela.
Mão-de-obra grátis
A revolta de Spartacus só se tornou possível porque Roma, nos dois séculos anteriores ao nascimento do guerreiro, havia se tornado a senhora (quase) absoluta da bacia do Mediterrâneo. Numa série de conquistas, envolvendo basicamente o império de Cartago e as regiões dominadas por macedônios e gregos, Roma incorporou vastos territórios, muitos deles ricos em solos férteis e recursos agrícolas. Além disso, havia um bônus: no mundo antigo, os derrotados nas guerras tradicionalmente se tornavam escravos.
Depois de vencer meio mundo em batalha, Roma deixou de ser uma civilização formada basicamente por homens livres e pequenos proprietários de terra para se tornar a dona de uma multidão de escravos. Algumas estimativas modernas sugerem que, na época, havia um escravo para cada três pessoas livres. O problema, porém, não era só esse desequilíbrio demográfico: a mão-de-obra servil favoreceu os grandes proprietários de terra, que passaram a adquirir as pequenas propriedades dos camponeses livres por meios legais ou ilegais. Assim, a zona rural da Itália estava lotada de “sem-terra” e pequenos agricultores empobrecidos e encurralados – um fator que acabaria favorecendo Spartacus e seus comandados. Nas três ou quatro décadas que precederam a revolta do gladiador, a situação explosiva criou outros levantes no campo italiano, em especial na recém-conquistada Sicília.
Embora a principal vantagem econômica de incorporar tantos escravos ao império fosse seu emprego na agricultura, havia um contingente, digamos, diferenciado de cativos. Alguns se tornavam servidores domésticos ou, no caso de certas mulheres, literalmente escravas sexuais de seus amos. Mas entre os mais apreciados pelos romanos estavam os escravos destinados às lutas de gladiadores, uma das formas mais populares de entretenimento público no império. As lutas, ou ludi (“jogos”, em latim), como eram mais conhecidas na época, quase sempre comemoravam grandes triunfos militares. Os que tomavam parte dos combates nem sempre recebiam treinamento especial. No entanto, lutadores com potencial para conquistar as multidões eram muito procurados e logo eram incorporados a academias especiais, onde eram treinados e recebiam até certa dose de regalias.
Foi justamente num estabelecimento desses, mantido por um sujeito chamado Lentulus Batiatus, em Cápua, sul da Itália, que Spartacus e seus companheiros originais viviam. Segundo o historiador grego Plutarco, que escreveu seu relato no século 2 d.C., “a maioria deles era de origem gaulesa ou trácia. Esses homens não haviam feito nada de errado, mas, simplesmente por causa da crueldade de seu amo, eram mantidos em confinamento até que chegasse a hora de entrarem em combate”. (A referência a “não fazer nada de errado” tem a ver com o fato de que criminosos condenados às vezes também eram mandados para a arena.) Como sempre, fica óbvio que os historiadores do mundo antigo não faziam muito bem, sua lição de casa: as designações “gauleses” (ou seja, nativos da Gália, na atual França) e “trácios” (originários da Trácia, região que corresponde a partes da Grécia e Bulgária atuais) podem não indicar a origem geográfica, mas o tipo de “modalidade” gladiatorial que os homens de Batiatus praticavam.
Seja como for, a maioria dos autores greco-romanos diz que Spartacus era um nativo da Trácia. Para Apiano, escritor contemporâneo de Plutarco e originário de Alexandria, no Egito, ele teria lutado contra os romanos e feito prisioneiro – os trácios eram famosos por seu espírito de luta e, em certo sentido, até selvageria. Plutarco acrescenta, já criando uma aura mítica em torno do gladiador: “Dizem que, quando o levaram a Roma para ser vendido, uma serpente foi vista enrolando-se em torno da cabeça dele enquanto dormia. Sua mulher, que pertencia à mesmo tribo e era uma profetisa, submetida ao êxtase do deus Dioniso, declarou que esse sinal significava que ele teria um poder grande e terrível, o qual, no final, iria levá-lo ao infortúnio”. A história tem toda a cara de ser uma invenção de Plutarco, já que na tradição grega os trácios é que teriam levado o culto de Dioniso para o resto do Mediterrâneo.
Quebrando tudo
Verdade ou mentira, o fato é que Spartacus tinha pelo menos uma virtude: a iniciativa. No ano 73 a.C., ele se tornou o cabeça de uma fuga envolvendo 78 escravos, que se armaram com facas de cozinha e qualquer outro instrumento cortante à vista e deram o fora da tal “academia”. Segundo o mesmo Plutarco, o grupo deu a sorte de cruzar com um carregamento de armas para gladiadores que se dirigia para outra cidade e capturá-lo, o que aumentou suas chances de resistir à eventualidade de um ataque.
Os gladiadores, que tinham como líderes, além de Spartacus, dois sujeitos conhecidos como Crixus e Oenomaus (supostamente gauleses, embora a classificação também seja duvidosa), se refugiaram no cume do vulcão Vesúvio. Puseram-se a atacar e pilhar as propriedades rurais vizinhas, atraindo mais e mais escravos fugitivos para seu lado. Mas não só cativos: pastores e camponeses pobres da região também começaram a se unir em massa ao chefe gladiador.
As autoridades romanas demoraram para se dar conta da gravidade da situação. Basta dizer que sua primeira tentativa de acabar com a rebelião foi mandar contra Spartacus uma força de 3 mil homens que tinham acabado de entrar para o exército e não tinham treinamento algum. Seu líder, Caio Cláudio Glaber, se limitou a montar seu acampamento bloqueando a trilha que levava para fora do Vesúvio, achando que conseguiria fazer os gladiadores se render pela fome. Segundo relatos da época, porém, o vulcão tinha seu topo coberto por videiras selvagens, que Spartacus e seus companheiros usaram para tecer cordas, com as quais desceram pelo outro lado da montanha. Atacaram Glaber por trás e aniquilaram seu exército de novatos.
Depois dessa primeira grande vitória do gladiador, muitos de seus seguidores decidiram marchar para o norte com a intenção de deixar a Itália e voltar para seus países de origem. Enquanto isso, o governo romano resolveu agir e mandou contra Spartacus duas legiões – cerca de 12 mil homens – comandadas pelos dois cônsules, os chefes de governo da república. Parte do exército de escravos, liderado por Crixus, se separou de Spartacus e acabou dizimada, mas o líder rebelde conseguiu derrotar ambas as legiões.
No fim, os revoltosos (com 90 mil pessoas em seu grupo) chegaram aos Alpes. Mas parte dos homens queria continuar a viver de pilhagem, o que os levou a voltar a Itália. O governo de Roma deu então o comando de dez legiões a Crasso e convocou o herói de guerra Pompeu. Os dois encurralaram Spartacus no sul da Itália. O gladiador e seus homens ainda venceram batalhas. Durante uma delas, o gladiador atacou Crasso e morreu em combate com milhares de seus homens. Outros 6 mil escravos foram crucificados na estrada que ia de Roma a Cápua – a Via Ápia.
Dois filmes sobre Spartacus
O clássico
Com a direção de Stanley Kubrick, responsável por outros clássicos, como 2001: uma Odisséia no Espaço, esse filme, de 1960, é provavelmente a principal fonte da fama do líder escravo nos dias de hoje. Dirigida com todo o capricho técnico dos épicos de Hollywood da época, a obra segue à risca a receita do cinemão, até dando ao herói, interpretado por Kirk Douglas, uma paixão pela bela escrava Varínia. O Spartacus do filme é um lutador típico, que quer libertar todos os escravos do império.
O enlatado
Como no ramo nada se cria nos últimos tempos, produtores norte-americanos decidiram fazer, em 2004, uma minissérie para a TV com base no filme de Kubrick. Que essa é a fonte original de Spartacus está na cara pela presença da bela Varínia mais uma vez (um personagem nunca registrado historicamente). De quebra, o herói, encarnado pelo ator croata Goran Visjnic, come o pão que o diabo amassou, trabalhando no deserto egípcio antes de virar gladiador. O que, aliás, lembra outro famoso gladiador do cinema...
Treinamento básico de um soldado
A principal diferença entre as legiões do exército romano e boa parte dos povos que enfrentava em batalha era este detalhe decisivo: a disciplina. Ao menos durante a fase áurea do império, quem ingressava numa legião sabia estar aceitando um período extenso e exclusivo de serviço militar, com duração de 25 anos. O coração das legiões era a infantaria, que era treinada para lutar de forma ao mesmo tempo coesa e flexível. As duas principais armas do legionário eram o pilo, uma lança curta que era arremessada assim que o combate começava, e o gládio, uma pequena espada para o duelo corporal. Uma sacada tecnológica simples tornava o pilo especialmente importante: se ele atingisse o escudo do inimigo, sua ponta se dobrava para dentro e ele ficava enganchado, o que levava a pessoa sob ataque a ter de se livrar do escudo. Além do treinamento para manobras como essa, os soldados romanos também estavam acostumados a carregar mais de 30 kg de seu próprio equipamento em marchas forçadas durante as viagens.
.:: Aventuras na História
Últimos suspiros da República Romana

Um exército dos mais improváveis virou de pernas para o ar o coração do Império Romano, cerca de 70 anos antes do nascimento de Cristo. Embora fosse inteiramente formada por escravos, a imensa maioria deles sem nenhuma experiência militar, essa força rebelde chegou a contar com 90 mil soldados, deu um trabalho imenso aos principais comandantes de Roma e chegou perto de engendrar o colapso político e econômico da Itália. À frente dos revoltosos estava um ex-gladiador, um gênio militar nato, apesar da origem aparentemente humilde. Seu nome era Spartacus.
Mais de 2 mil anos depois, os detalhes da vida e personalidade desse guerreiro foram quase totalmente engolidos pela lenda. Para os antigos historiadores gregos e romanos, ele não passava de um bandido, enquanto teóricos socialistas e revolucionários de todos os tipos o transformaram num herói quase sobre-humano. Calúnias ou idealizações à parte, o fato é que a história de Spartacus e seu exército mostram à perfeição como a enxurrada de escravos que havia inundado o Império Romano criou um desequilíbrio social de proporções bíblicas. Sem saber, os romanos tinham plantado a semente de seu próprio pesadelo, embora, no fim das contas, tenham conseguido acabar com ela.
Mão-de-obra grátis
A revolta de Spartacus só se tornou possível porque Roma, nos dois séculos anteriores ao nascimento do guerreiro, havia se tornado a senhora (quase) absoluta da bacia do Mediterrâneo. Numa série de conquistas, envolvendo basicamente o império de Cartago e as regiões dominadas por macedônios e gregos, Roma incorporou vastos territórios, muitos deles ricos em solos férteis e recursos agrícolas. Além disso, havia um bônus: no mundo antigo, os derrotados nas guerras tradicionalmente se tornavam escravos.
Depois de vencer meio mundo em batalha, Roma deixou de ser uma civilização formada basicamente por homens livres e pequenos proprietários de terra para se tornar a dona de uma multidão de escravos. Algumas estimativas modernas sugerem que, na época, havia um escravo para cada três pessoas livres. O problema, porém, não era só esse desequilíbrio demográfico: a mão-de-obra servil favoreceu os grandes proprietários de terra, que passaram a adquirir as pequenas propriedades dos camponeses livres por meios legais ou ilegais. Assim, a zona rural da Itália estava lotada de “sem-terra” e pequenos agricultores empobrecidos e encurralados – um fator que acabaria favorecendo Spartacus e seus comandados. Nas três ou quatro décadas que precederam a revolta do gladiador, a situação explosiva criou outros levantes no campo italiano, em especial na recém-conquistada Sicília.
Embora a principal vantagem econômica de incorporar tantos escravos ao império fosse seu emprego na agricultura, havia um contingente, digamos, diferenciado de cativos. Alguns se tornavam servidores domésticos ou, no caso de certas mulheres, literalmente escravas sexuais de seus amos. Mas entre os mais apreciados pelos romanos estavam os escravos destinados às lutas de gladiadores, uma das formas mais populares de entretenimento público no império. As lutas, ou ludi (“jogos”, em latim), como eram mais conhecidas na época, quase sempre comemoravam grandes triunfos militares. Os que tomavam parte dos combates nem sempre recebiam treinamento especial. No entanto, lutadores com potencial para conquistar as multidões eram muito procurados e logo eram incorporados a academias especiais, onde eram treinados e recebiam até certa dose de regalias.
Foi justamente num estabelecimento desses, mantido por um sujeito chamado Lentulus Batiatus, em Cápua, sul da Itália, que Spartacus e seus companheiros originais viviam. Segundo o historiador grego Plutarco, que escreveu seu relato no século 2 d.C., “a maioria deles era de origem gaulesa ou trácia. Esses homens não haviam feito nada de errado, mas, simplesmente por causa da crueldade de seu amo, eram mantidos em confinamento até que chegasse a hora de entrarem em combate”. (A referência a “não fazer nada de errado” tem a ver com o fato de que criminosos condenados às vezes também eram mandados para a arena.) Como sempre, fica óbvio que os historiadores do mundo antigo não faziam muito bem, sua lição de casa: as designações “gauleses” (ou seja, nativos da Gália, na atual França) e “trácios” (originários da Trácia, região que corresponde a partes da Grécia e Bulgária atuais) podem não indicar a origem geográfica, mas o tipo de “modalidade” gladiatorial que os homens de Batiatus praticavam.
Seja como for, a maioria dos autores greco-romanos diz que Spartacus era um nativo da Trácia. Para Apiano, escritor contemporâneo de Plutarco e originário de Alexandria, no Egito, ele teria lutado contra os romanos e feito prisioneiro – os trácios eram famosos por seu espírito de luta e, em certo sentido, até selvageria. Plutarco acrescenta, já criando uma aura mítica em torno do gladiador: “Dizem que, quando o levaram a Roma para ser vendido, uma serpente foi vista enrolando-se em torno da cabeça dele enquanto dormia. Sua mulher, que pertencia à mesmo tribo e era uma profetisa, submetida ao êxtase do deus Dioniso, declarou que esse sinal significava que ele teria um poder grande e terrível, o qual, no final, iria levá-lo ao infortúnio”. A história tem toda a cara de ser uma invenção de Plutarco, já que na tradição grega os trácios é que teriam levado o culto de Dioniso para o resto do Mediterrâneo.
Quebrando tudo
Verdade ou mentira, o fato é que Spartacus tinha pelo menos uma virtude: a iniciativa. No ano 73 a.C., ele se tornou o cabeça de uma fuga envolvendo 78 escravos, que se armaram com facas de cozinha e qualquer outro instrumento cortante à vista e deram o fora da tal “academia”. Segundo o mesmo Plutarco, o grupo deu a sorte de cruzar com um carregamento de armas para gladiadores que se dirigia para outra cidade e capturá-lo, o que aumentou suas chances de resistir à eventualidade de um ataque.
Os gladiadores, que tinham como líderes, além de Spartacus, dois sujeitos conhecidos como Crixus e Oenomaus (supostamente gauleses, embora a classificação também seja duvidosa), se refugiaram no cume do vulcão Vesúvio. Puseram-se a atacar e pilhar as propriedades rurais vizinhas, atraindo mais e mais escravos fugitivos para seu lado. Mas não só cativos: pastores e camponeses pobres da região também começaram a se unir em massa ao chefe gladiador.
As autoridades romanas demoraram para se dar conta da gravidade da situação. Basta dizer que sua primeira tentativa de acabar com a rebelião foi mandar contra Spartacus uma força de 3 mil homens que tinham acabado de entrar para o exército e não tinham treinamento algum. Seu líder, Caio Cláudio Glaber, se limitou a montar seu acampamento bloqueando a trilha que levava para fora do Vesúvio, achando que conseguiria fazer os gladiadores se render pela fome. Segundo relatos da época, porém, o vulcão tinha seu topo coberto por videiras selvagens, que Spartacus e seus companheiros usaram para tecer cordas, com as quais desceram pelo outro lado da montanha. Atacaram Glaber por trás e aniquilaram seu exército de novatos.
Depois dessa primeira grande vitória do gladiador, muitos de seus seguidores decidiram marchar para o norte com a intenção de deixar a Itália e voltar para seus países de origem. Enquanto isso, o governo romano resolveu agir e mandou contra Spartacus duas legiões – cerca de 12 mil homens – comandadas pelos dois cônsules, os chefes de governo da república. Parte do exército de escravos, liderado por Crixus, se separou de Spartacus e acabou dizimada, mas o líder rebelde conseguiu derrotar ambas as legiões.
No fim, os revoltosos (com 90 mil pessoas em seu grupo) chegaram aos Alpes. Mas parte dos homens queria continuar a viver de pilhagem, o que os levou a voltar a Itália. O governo de Roma deu então o comando de dez legiões a Crasso e convocou o herói de guerra Pompeu. Os dois encurralaram Spartacus no sul da Itália. O gladiador e seus homens ainda venceram batalhas. Durante uma delas, o gladiador atacou Crasso e morreu em combate com milhares de seus homens. Outros 6 mil escravos foram crucificados na estrada que ia de Roma a Cápua – a Via Ápia.
Dois filmes sobre Spartacus
O clássico
Com a direção de Stanley Kubrick, responsável por outros clássicos, como 2001: uma Odisséia no Espaço, esse filme, de 1960, é provavelmente a principal fonte da fama do líder escravo nos dias de hoje. Dirigida com todo o capricho técnico dos épicos de Hollywood da época, a obra segue à risca a receita do cinemão, até dando ao herói, interpretado por Kirk Douglas, uma paixão pela bela escrava Varínia. O Spartacus do filme é um lutador típico, que quer libertar todos os escravos do império.
O enlatado
Como no ramo nada se cria nos últimos tempos, produtores norte-americanos decidiram fazer, em 2004, uma minissérie para a TV com base no filme de Kubrick. Que essa é a fonte original de Spartacus está na cara pela presença da bela Varínia mais uma vez (um personagem nunca registrado historicamente). De quebra, o herói, encarnado pelo ator croata Goran Visjnic, come o pão que o diabo amassou, trabalhando no deserto egípcio antes de virar gladiador. O que, aliás, lembra outro famoso gladiador do cinema...
Treinamento básico de um soldado
A principal diferença entre as legiões do exército romano e boa parte dos povos que enfrentava em batalha era este detalhe decisivo: a disciplina. Ao menos durante a fase áurea do império, quem ingressava numa legião sabia estar aceitando um período extenso e exclusivo de serviço militar, com duração de 25 anos. O coração das legiões era a infantaria, que era treinada para lutar de forma ao mesmo tempo coesa e flexível. As duas principais armas do legionário eram o pilo, uma lança curta que era arremessada assim que o combate começava, e o gládio, uma pequena espada para o duelo corporal. Uma sacada tecnológica simples tornava o pilo especialmente importante: se ele atingisse o escudo do inimigo, sua ponta se dobrava para dentro e ele ficava enganchado, o que levava a pessoa sob ataque a ter de se livrar do escudo. Além do treinamento para manobras como essa, os soldados romanos também estavam acostumados a carregar mais de 30 kg de seu próprio equipamento em marchas forçadas durante as viagens.
.:: Aventuras na História
Últimos suspiros da República Romana
Consideradas um símbolo da vitória da moral sobre a corrupção na vida pública, as Catilinárias de Cícero registram o derradeiro triunfo do regime aristocrático na Roma antiga
Em 63 a.C., Marco Túlio Cícero, o maior filósofo romano de todos os tempos, ocupava o posto de cônsul, cargo máximo do Senado, quando descobriu que um de seus colegas organizava uma conspiração para assassiná-lo. O mentor do complô era o senador Lúcio Catilina, nobre arruinado por dívidas que contava com o apoio de outros homens ricos e militares igualmente debilitados financeiramente para tomar o poder.
O filósofo contra o corrupto: Cícero acusa Catilina de planejar uma conspiração
contra o Senado/Cícero denuncia Catilina, afresco, Cesare Maccari, 1882-1888.
Ao se inteirar dos planos de seu adversário, Cícero convocou uma reunião do Senado e proferiu o primeiro de seus quatro célebres discursos contra Catilina, que ficariam conhecidos como Catilinárias. A intervenção de Cícero se tornou um clássico da política e passou a ser invocada ao longo dos últimos 2 mil anos sempre que um homem público atenta contra o interesse geral da população.
Tomadas como um exemplo de correção no exercício do poder público, as Catilinárias revelam, na verdade, um momento muito específico da história de Roma: aquele em que a República aristocrática lutava para resistir às investidas de generais e políticos amparados por um poder militar cada vez maior.
Por fim, Cícero conseguiu sufocar a revolta de Catilina e deu uma sobrevida de mais alguns anos à República romana. O regime, porém, seria finalmente ferido de morte quando Júlio César cruzou o rio Rubicão e invadiu a península Itálica com suas legiões em 49 a.C..
Trechos do discurso
“Até quando, enfim, ó Catilina, abusarás da nossa paciência? Por quanto tempo ainda este teu rancor nos enganará? Até que ponto a tua audácia desenfreada se gabará?” (Livro I, cap. I)
“Agora [tu, Catilina] já atacas abertamente toda a República; chamas para o extermínio e para a devastação os templos dos deuses imortais, as casas da cidade, e a vida de todos os cidadãos, enfim, a Itália inteira.” (Livro I, cap. V)
“Efetivamente nenhuma nação existe que temamos; nenhum rei há que possa fazer a guerra ao povo romano. Todas as coisas externas estão pacificadas (...) resta só a guerra doméstica.” (Livro II, cap. V)
Fonte: Tradução das Catilinárias de Cícero, de Maximiniano Augusto Gonçalves (Livraria H. Antunes Editora)
Todos os caminhos levam a Roma
Em 63 a.C., Marco Túlio Cícero, o maior filósofo romano de todos os tempos, ocupava o posto de cônsul, cargo máximo do Senado, quando descobriu que um de seus colegas organizava uma conspiração para assassiná-lo. O mentor do complô era o senador Lúcio Catilina, nobre arruinado por dívidas que contava com o apoio de outros homens ricos e militares igualmente debilitados financeiramente para tomar o poder.

Ao se inteirar dos planos de seu adversário, Cícero convocou uma reunião do Senado e proferiu o primeiro de seus quatro célebres discursos contra Catilina, que ficariam conhecidos como Catilinárias. A intervenção de Cícero se tornou um clássico da política e passou a ser invocada ao longo dos últimos 2 mil anos sempre que um homem público atenta contra o interesse geral da população.
Tomadas como um exemplo de correção no exercício do poder público, as Catilinárias revelam, na verdade, um momento muito específico da história de Roma: aquele em que a República aristocrática lutava para resistir às investidas de generais e políticos amparados por um poder militar cada vez maior.
Por fim, Cícero conseguiu sufocar a revolta de Catilina e deu uma sobrevida de mais alguns anos à República romana. O regime, porém, seria finalmente ferido de morte quando Júlio César cruzou o rio Rubicão e invadiu a península Itálica com suas legiões em 49 a.C..
Trechos do discurso
“Até quando, enfim, ó Catilina, abusarás da nossa paciência? Por quanto tempo ainda este teu rancor nos enganará? Até que ponto a tua audácia desenfreada se gabará?” (Livro I, cap. I)
“Agora [tu, Catilina] já atacas abertamente toda a República; chamas para o extermínio e para a devastação os templos dos deuses imortais, as casas da cidade, e a vida de todos os cidadãos, enfim, a Itália inteira.” (Livro I, cap. V)
“Efetivamente nenhuma nação existe que temamos; nenhum rei há que possa fazer a guerra ao povo romano. Todas as coisas externas estão pacificadas (...) resta só a guerra doméstica.” (Livro II, cap. V)
Fonte: Tradução das Catilinárias de Cícero, de Maximiniano Augusto Gonçalves (Livraria H. Antunes Editora)
Todos os caminhos levam a Roma
Hoje em dia, os caminhos terrestres, aéreos ou marítimos levam viajantes a qualquer lugar. Porém, quando queremos dizer que todas as alternativas têm a mesma solução, dizemos que “todos os caminhos levam a Roma”. A tradição vem, é claro, dos tempos da antiga Roma, quando a cidade dos césares era o umbigo do mundo. “No século 1, quando o Império ia da Bretanha (na atual Inglaterra) à Pérsia (no atual Irã), Roma chegou a ter 80 mil quilômetros de estradas”, segundo pesquisa da historiadora Maria Luiza Corassin, da Universidade de São Paulo.
Mas as vias romanas não eram como as atuais, nem seus propósitos eram os mesmos. “Elas não se destinavam ao transporte de pessoas e cargas. Chamadas de cursus publicus, eram muito mais um meio de comunicação, por onde mensageiros levavam ordens de um canto a outro do império”, afirma Maria Luiza. Segundo ela, esse correio era tão eficiente que podia percorrer 270 quilômetros em um dia, marca que não foi superada na Europa até o século 19.

Com os romanos, a engenharia rodoviária atingiu o ponto máximo de eficiência e aprimoramento tecnológico da antiguidade. No auge do poder de Roma, foram construídos perto de 85.000km de estradas que ligavam a capital às fronteiras mais distantes do império. Irradiavam de Roma 29 grandes estradas militares, das quais a mais conhecida é a via Ápia, que se estendia por 660km. Há divergências sobre a origem dos métodos romanos de construção de estradas, mas é consenso que seus principais mestres foram etruscos do norte da Itália. Os romanos incorporaram também técnicas aprendidas de diversos outros povos, como os cartagineses, fenícios e egípcios.
As estradas romanas eram verdadeiros prodígios para a engenharia da época. Eles usavam pedras e cimento acomodados sobre leitos aplainados e aterrados. As vias eram traçadas sempre em linha reta e passavam por cima de lagos, pântanos e montanhas. As pedras para o calçamento tinha superfícies curvas para facilitar a drenagem, outra novidade para a época. Ao largo delas havia postos de parada e descanso para guarnições militares.
Decadência do sistema rodoviário
No auge do Império Romano, o comércio pelas rodovias ligava as culturas da Europa, norte da África, Anatólia, China e Índia. Mas esse sistema dependia dos impérios, principalmente o romano e, com seu declínio a partir do século IV da era cristã, as rotas comerciais tornaram-se os caminhos de invasão. Praticamente todas as redes rodoviárias sofreram um processo irreversível de decadência.
Testemunhas do poder, da tecnologia e do espírito conquistador dos romanos, essas estradas não resistiram, porém, às invasões bárbaras a partir do século 3. Anos depois da queda definitiva do Império Romano do Ocidente, em 476, as pedras cortadas e polidas com precisão foram utilizadas para erguer os castelos medievais.
Por volta do século XII, renasceu o interesse pela construção e manutenção das estradas, especialmente na Europa, mas a peste negra do século XIV e as contínuas guerras entre principados interromperam novamente o processo.
Os vestígios de algumas dessas estradas romanas ainda podem ser vistos na Bretanha, por exemplo, ou em Roma, onde a principal delas, a Via Ápia, ainda recebe todos os anos milhões de visitantes.
Mas as vias romanas não eram como as atuais, nem seus propósitos eram os mesmos. “Elas não se destinavam ao transporte de pessoas e cargas. Chamadas de cursus publicus, eram muito mais um meio de comunicação, por onde mensageiros levavam ordens de um canto a outro do império”, afirma Maria Luiza. Segundo ela, esse correio era tão eficiente que podia percorrer 270 quilômetros em um dia, marca que não foi superada na Europa até o século 19.

Com os romanos, a engenharia rodoviária atingiu o ponto máximo de eficiência e aprimoramento tecnológico da antiguidade. No auge do poder de Roma, foram construídos perto de 85.000km de estradas que ligavam a capital às fronteiras mais distantes do império. Irradiavam de Roma 29 grandes estradas militares, das quais a mais conhecida é a via Ápia, que se estendia por 660km. Há divergências sobre a origem dos métodos romanos de construção de estradas, mas é consenso que seus principais mestres foram etruscos do norte da Itália. Os romanos incorporaram também técnicas aprendidas de diversos outros povos, como os cartagineses, fenícios e egípcios.
As estradas romanas eram verdadeiros prodígios para a engenharia da época. Eles usavam pedras e cimento acomodados sobre leitos aplainados e aterrados. As vias eram traçadas sempre em linha reta e passavam por cima de lagos, pântanos e montanhas. As pedras para o calçamento tinha superfícies curvas para facilitar a drenagem, outra novidade para a época. Ao largo delas havia postos de parada e descanso para guarnições militares.
Decadência do sistema rodoviário
No auge do Império Romano, o comércio pelas rodovias ligava as culturas da Europa, norte da África, Anatólia, China e Índia. Mas esse sistema dependia dos impérios, principalmente o romano e, com seu declínio a partir do século IV da era cristã, as rotas comerciais tornaram-se os caminhos de invasão. Praticamente todas as redes rodoviárias sofreram um processo irreversível de decadência.
Testemunhas do poder, da tecnologia e do espírito conquistador dos romanos, essas estradas não resistiram, porém, às invasões bárbaras a partir do século 3. Anos depois da queda definitiva do Império Romano do Ocidente, em 476, as pedras cortadas e polidas com precisão foram utilizadas para erguer os castelos medievais.
Por volta do século XII, renasceu o interesse pela construção e manutenção das estradas, especialmente na Europa, mas a peste negra do século XIV e as contínuas guerras entre principados interromperam novamente o processo.
Os vestígios de algumas dessas estradas romanas ainda podem ser vistos na Bretanha, por exemplo, ou em Roma, onde a principal delas, a Via Ápia, ainda recebe todos os anos milhões de visitantes.
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