sábado, 22 de março de 2014

A Roma do Oriente

Há 2000 anos o imperador Han elevou sua dinastia a uma era dourada, tão próspera quanto a do Império Romano

 
Emissário da dinastia Han retorna à cidade de Chagan
 
Emissário Zhang Qian, emissário de Wu Di (imperador Marcial), retorna triunfante à capital da Han Ocidental, Chagan, parte da atual cidade de Xian
A dinastia surgiu há 2,2 mil anos e durou mais de quatro séculos. Hoje, chineses étnicos ainda se apresentam como Han, orgulhosos de uma era dourada da arte, política e tecnologia. Um tempo em que a China rivalizou em poder e prestígio com o Império Romano.
Debaixo de uma frondosa árvore frei-jorge, o ferreiro da aldeia martela o ferro incandescente. Depois de muito bater, o que era uma simples placa de metal começa a parecer uma enxada – um instrumento bruto, pesado, largo, de lâmina grossa, uma ferramenta para durar muito tempo. “Estas não quebram”, diz um aldeão sobre as enxadas feitas por Liu Shiwa. “Estou usando uma há 12 anos.”
Na aldeia de Shijiawan, próximo à antiga cidade de Luoyang, no centro-leste da China, o ferreiro é um cidadão valorizado. As plantações da aldeia, com sua abundância de couve e cebola, devem seu solo arado e fofo às enxadas e aos ancinhos fabricados na forja na frente da casa de Liu Shiwa. Em seu quintal, dois porcos grunhem no chiqueiro, galinhas e um cachorro andam soltos.
É uma cena saída diretamente da dinastia Han. Os historiadores dizem que a era Han terminou há 18 séculos. Estão enganados. Aquele chiqueiro, as galinhas e o cão são idênticos às miniaturas em cerâmica do bricabraque agrícola que os Han colocavam nas sepulturas dos finados para simbolizar o sustento no além. A forja e a enxada autenticam o quadro, pois artigos de ferro eram a marca registrada dos Han.
Outra marca registrada dos Han: durabilidade. Uma das mais longas dinastias da China, eles sobreviveram, com uma insignificante interrupção, por mais de quatro séculos. Desde sua fundação, em 206 a.C., o Estado Han foi tão poderoso no leste da Ásia quanto foi no Ocidente o Império Romano, mais ou menos contemporâneo. Como Roma, expandiu-se por territórios “bárbaros” adjacentes, particularmente a noroeste, onde seus exércitos abriram caminho para o comércio via Rota da Seda. E, como Roma, a dinastia gerou governantes fracos e enfrentou a decadência antes de sucumbir, em 220 d.C.
Ainda assim, legou um modelo de governo ideal – uma nação unida e um regime auto-perpetuador – que se tornou a meta de todas as dinastias subseqüentes, inclusive na China atual, oficialmente comunista mas com o capitalismo irrompendo em todo canto. Também no legado Han encontramos dinâmicas espirituais e éticas que norteiam milhões de asiáticos. Uma delas, o confucionismo, baseado nos valores morais de Confúcio, tornou-se a ideologia oficial da corte Han (não que seus governantes primassem pela moralidade). Até o nome Han, que designava um rio e foi adotado pelo primeiro imperador, perdura. É com ele que os chineses étnicos ainda se identificam: Han ren, o povo Han.
Em muitos aspectos, os trabalhadores Han estavam bem mais adiantados que os romanos. Usavam carrinhos de mão e roldanas para mover objetos, monjolos movidos a água para pulverizar grãos e minérios, foles para bombear o ar nas fornalhas. Quando um imperador saía em sua carruagem, ficava à sombra de um guarda-sol, único em sua época, que podia ser fechado graças a hastes metálicas deslizantes. E os Han foram os primeiros a produzir um artigo revolucionário para o aprendizado, que eles chamavam de zhi. Nós, de papel.
Um eunuco, Cai Lun, contou ao imperador sobre a feitura do papel no ano 105 d.C. Talvez Cai Lun usasse métodos semelhantes aos que vi em uma oficina de fabricação de papel no sul de Nanquim. Dois homens mergulhavam uma tela num barril com uma polpa parecida com mingau de aveia, feita com casca interna de árvore e palha de arroz. Erguiam na tela uma camada dessa papa – tinha de estar lisa, não muito grossa nem fina demais. Prensada e seca, tornava-se uma folha de papel de calígrafo de alta qualidade

Nenhum comentário:

Postar um comentário