Impérios sobre os Andes
A vida e a obra dos waris e dos tiwanakus, dois povos andinos que, antes dos incas, definiram o conceito de império na América

Fagulhas chovem como bençãos na festa da Virgem da Candelária, a quem a população atribui poderes curativos.
Não havia dúvida de que os saqueadores arrombaram o túmulo real da antiga capital andina de Wari, no Peru, e depois desceram jogando uma corda no poço revestido de pedras. Fugiram depois com todos os tesouros que o povo wari deixara ali para homenagear seus mortos. Agora, de lanterna em punho, sou eu que vou me esgueirando pelo buraco da entrada do túmulo. Quero olhar de perto o artístico trabalho em pedra feito pelos esquecidos construtores dos Andes.
Muito antes da fundação do Império Inca, que abarcava toda a região andina, o povo wari (ou huari) criou outro império quase com a mesma extensão, e muito mais duradouro. Enquanto a nação inca mal durou 100 anos, os waris resistiram por mais de 400 anos – do 600 até 1000 d.C., aproximadamente. O mesmo ocorreu com um reino vizinho na Bolívia, o tiwanaku (ou tiahuanaco). Essas duas civilizações estabeleceram a base para os impérios andinos que surgiram depois.
Seguindo os passos de William Isbell, arqueólogo da Universidade Estadual de Nova York, vou descendo por uma escada de corda pelo poço escuro, com pouco mais de 2 metros quadrados. Cinco metros abaixo, o poço termina no chão coberto de entulho. Acendo a lanterna para examinar o muro de pedra ao meu redor. Todas as pedras foram polidas e cada uma se encaixa perfeitamente nas pedras vizinhas. Logo abaixo de mim, Isbell vai dando ordens. “Está vendo uma pequena abertura logo atrás de você? Entre por aí.” Iluminando o buraco negro, me arrasto em meio às pedras jogadas no chão e chego a outra câmara, menor, 1,5 metro abaixo do primeiro nível. O teto ali é formado por enormes lajes de pedra e o chão está soterrado de pilhas de pedras soltas, cobertas de pó. Ficamos agachados, pois a câmara é baixa – impossível ficar em pé. Isbell explica: “Os waris cavaram este túmulo com o formato de uma lhama e depois o revestiram de pedras. Estamos na cabeça do animal”.
Ele ilumina a beirada das paredes. “Olhe atrás de mim. Há outro compartimento que forma as orelhas.” Espio dentro de uma câmara cujas paredes estreitas se projetam para longe. Tento visualizar esse túmulo em forma de lhama. Ele ilumina o lado oposto: “À nossa frente estão a barriga e as pernas”.
Isbell, um grandalhão de barba e cabelo grisalhos, vai rastejando até a barriga da lhama. Quatro aposentos menores – as quatro pernas – saem deste aposento mais longo. Examinamos um por um. Com dificuldade, finalmente chegamos ao menor compartimento de todos – a cauda da lhama. “Acreditamos que este é o local onde o rei foi enterrado”, diz Isbell, debruçado sobre a beirada de um estreito poço circular escavado no chão. Os arqueólogos anteriores não descobriram objetos que indicassem realeza em nenhum desses compartimentos, mas Isbell acredita que a estrutura diferenciada desta câmara subterrânea significa que ela foi construída para o membro mais elevado da elite wari. Bem na base da tumba, 4 metros abaixo de nós, vemos uma cavidade vazia revestida de pedras.
Na época da construção, mais de mil anos atrás, ali talvez estivesse a múmia de um líder da casa real, junto com vasos de cerâmica cheios de alimentos, e primorosos objetos de ouro, prata e turquesa. “Uma estrutura assim demonstra que os waris eram exímios arquitetos e engenheiros”, diz Isbell.
Os waris foram o primeiro povo com mentalidade imperial em todo o continente americano. Em seu auge, o império wari abrangia a parte mais elevada dos Andes, estendendo-se para o norte por cerca de 1,5 mil quilômetros a partir da fronteira sul do país onde hoje é o Peru. Assim como outras potências, os waris controlavam colônias distantes, inclusive algumas ao longo do litoral sul do Peru. E, tal como outros impérios, tinham um rival, os tiwanakus, que viviam às margens do lago Titicaca, na Bolívia. Ambas as culturas tinham uma elite governante que dirigia a construção de grandiosas cidades, templos e palácios. As duas também compartilhavam certos símbolos e crenças religiosas, e as utilizavam, combinadas com suas diretrizes políticas, para controlar territórios e seus povos. Cerca de mil anos atrás, os dois impérios desmoronaram.
“Foram os waris, e até certo ponto os tiwanakus, que introduziram nos Andes a noção de império”, diz a arqueóloga Katharina Schreiber, da Universidade da Califórnia. “Quando os incas surgiram, a população já compreendia esse conceito.” Apesar de sua importância, até há pouco os waris estavam quase esquecidos, pois os arqueólogos consideravam os tiwanakus os únicos inventores do imperialismo andino. Os próprios incas viam os tiwanakus como seus antepassados imediatos. Nos últimos 20 anos, porém, estudiosos começaram a redescobrir o reino wari e compreender sua relação com seus vizinhos mais poderosos e místicos, os tiwanakus. Ao fazer isso, descobriram também o quanto os incas aprenderam com ambas as culturas.
Muito antes da fundação do Império Inca, que abarcava toda a região andina, o povo wari (ou huari) criou outro império quase com a mesma extensão, e muito mais duradouro. Enquanto a nação inca mal durou 100 anos, os waris resistiram por mais de 400 anos – do 600 até 1000 d.C., aproximadamente. O mesmo ocorreu com um reino vizinho na Bolívia, o tiwanaku (ou tiahuanaco). Essas duas civilizações estabeleceram a base para os impérios andinos que surgiram depois.
Seguindo os passos de William Isbell, arqueólogo da Universidade Estadual de Nova York, vou descendo por uma escada de corda pelo poço escuro, com pouco mais de 2 metros quadrados. Cinco metros abaixo, o poço termina no chão coberto de entulho. Acendo a lanterna para examinar o muro de pedra ao meu redor. Todas as pedras foram polidas e cada uma se encaixa perfeitamente nas pedras vizinhas. Logo abaixo de mim, Isbell vai dando ordens. “Está vendo uma pequena abertura logo atrás de você? Entre por aí.” Iluminando o buraco negro, me arrasto em meio às pedras jogadas no chão e chego a outra câmara, menor, 1,5 metro abaixo do primeiro nível. O teto ali é formado por enormes lajes de pedra e o chão está soterrado de pilhas de pedras soltas, cobertas de pó. Ficamos agachados, pois a câmara é baixa – impossível ficar em pé. Isbell explica: “Os waris cavaram este túmulo com o formato de uma lhama e depois o revestiram de pedras. Estamos na cabeça do animal”.
Ele ilumina a beirada das paredes. “Olhe atrás de mim. Há outro compartimento que forma as orelhas.” Espio dentro de uma câmara cujas paredes estreitas se projetam para longe. Tento visualizar esse túmulo em forma de lhama. Ele ilumina o lado oposto: “À nossa frente estão a barriga e as pernas”.
Isbell, um grandalhão de barba e cabelo grisalhos, vai rastejando até a barriga da lhama. Quatro aposentos menores – as quatro pernas – saem deste aposento mais longo. Examinamos um por um. Com dificuldade, finalmente chegamos ao menor compartimento de todos – a cauda da lhama. “Acreditamos que este é o local onde o rei foi enterrado”, diz Isbell, debruçado sobre a beirada de um estreito poço circular escavado no chão. Os arqueólogos anteriores não descobriram objetos que indicassem realeza em nenhum desses compartimentos, mas Isbell acredita que a estrutura diferenciada desta câmara subterrânea significa que ela foi construída para o membro mais elevado da elite wari. Bem na base da tumba, 4 metros abaixo de nós, vemos uma cavidade vazia revestida de pedras.
Na época da construção, mais de mil anos atrás, ali talvez estivesse a múmia de um líder da casa real, junto com vasos de cerâmica cheios de alimentos, e primorosos objetos de ouro, prata e turquesa. “Uma estrutura assim demonstra que os waris eram exímios arquitetos e engenheiros”, diz Isbell.
Os waris foram o primeiro povo com mentalidade imperial em todo o continente americano. Em seu auge, o império wari abrangia a parte mais elevada dos Andes, estendendo-se para o norte por cerca de 1,5 mil quilômetros a partir da fronteira sul do país onde hoje é o Peru. Assim como outras potências, os waris controlavam colônias distantes, inclusive algumas ao longo do litoral sul do Peru. E, tal como outros impérios, tinham um rival, os tiwanakus, que viviam às margens do lago Titicaca, na Bolívia. Ambas as culturas tinham uma elite governante que dirigia a construção de grandiosas cidades, templos e palácios. As duas também compartilhavam certos símbolos e crenças religiosas, e as utilizavam, combinadas com suas diretrizes políticas, para controlar territórios e seus povos. Cerca de mil anos atrás, os dois impérios desmoronaram.
“Foram os waris, e até certo ponto os tiwanakus, que introduziram nos Andes a noção de império”, diz a arqueóloga Katharina Schreiber, da Universidade da Califórnia. “Quando os incas surgiram, a população já compreendia esse conceito.” Apesar de sua importância, até há pouco os waris estavam quase esquecidos, pois os arqueólogos consideravam os tiwanakus os únicos inventores do imperialismo andino. Os próprios incas viam os tiwanakus como seus antepassados imediatos. Nos últimos 20 anos, porém, estudiosos começaram a redescobrir o reino wari e compreender sua relação com seus vizinhos mais poderosos e místicos, os tiwanakus. Ao fazer isso, descobriram também o quanto os incas aprenderam com ambas as culturas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário